terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Mourinho e a irracionalidade no futebol

Sempre fui, e sempre serei, um apreciador de futebol. Admiro o nível de espetáculo e paixão que um jogo grande e bem jogado consegue proporcionar, criando um ambiente fantástico á sua volta que não deixa ninguém indiferente. Admiro e aplaudo o talento de quem com uma bola no pé consegue, numa cavalgada de 50 metros, num remate do meio da rua ou num passe cirúrgico, derrubar até a resistência das defesas mais fortes e mais bem organizadas, também elas merecedoras da minha admiração por todo o trabalho que exige jogar dessa forma. Seja o jogo mais aberto e alegre da Premier League ou o xadrez tático que impera em muitos dos jogos da Série A, é de futebol que se trata. O desporto-rei! Não devorando jogos atrás de jogos como fazia antes (nem pouco mais ou menos), ainda hoje gosto de parar para ver uma boa partida de bola.

Como qualquer adepto, tenho obviamente a minha queda, a fação que defendo (o Sport Lisboa e Benfica, no meu caso). E por muito que se fale em isenção, quem realmente se afirma de um clube não é, nunca, isento, por muito que o diga. Eu não sou, nem pretendo ser. Porque o futebol é para mim apenas um dos interesses que tenho na vida. Não é algo que me defina como pessoa ou como profissional, como tal posso tomar o partido que muito bem entender, e puxar por ele em casa ou no estádio.
Mas afirmar falta de isenção não é o mesmo que ser estúpido, nem é sinónimo de ultrapassar os limites da “irracionalidade saudável” que é o ser-se de um clube. E principalmente nos países em situação de crise latente na Europa têm surgido amiúde situações em que esses limites são largamente ultrapassados, desencadeando ações violentas sobre adeptos ou equipas. Muitas pessoas mostram uma tendência para descarregar as suas frustrações pessoais, os seus problemas de vida ou de trabalho em 90m de um jogo na sua equipa, ou em discussões acaloradas, chegando mesmo ao ponto da agressividade, com elementos de outras cores. Se a este grupo juntarmos um outro atulhado de gente com tendência para a violência gratuita (pois muitos fazem disso modo de vida, se é que me entendem) que é a maioria das claques de futebol, e postura irresponsável de alguns de alguns jogadores e dirigentes das equipas que incitam a comportamentos violentos e promovem a estupidez e ignorância, temos aqui um cocktail explosivo que urge ser controlado.

Mas quem de direito muitas vezes parece não estar interessado em refrear os ânimos, e a tendência para se cair no exagero alastra-se á mesma velocidade a que o desemprego aumenta. E por já ter crescido o suficiente para me considerar um adulto bem formado e não uma criancinha mimada ou alguém sem interesses na vida ou algo mais importante a que dedicar o tempo, opto pelo caminho oposto. Se uma conversa sobe de tom e passa a discussão, sou o primeiro a abandoná-la, e provocações pouco saudáveis são logo cortadas pela raiz. A bem dizer, tirando o meu clube que sigo sempre, o meu entusiasmo pelo futebol caiu a pique muito por estes comportamentos que refiro.

Comportamentos como estes que referi levam a episódios que qualquer pessoa de bom senso e com o mínimo de visão da realidade só pode classificar de lamentáveis e anedóticos. Foi o que aconteceu a José Mourinho este fim-de-semana. Quando uma ala do Santiago Barnabéu começou a cantar o seu nome, logo se desencadeou um inacreditável coro de assobios para o treinador que está no bom caminho para destronar o todo-poderoso Barcelona como campeão de Espanha, que teve uma Liga dos Campeões sem mácula, e que mesmo com a recente derrota em casa por 2-1 continua com algumas hipóteses de seguir em frente na Taça do Rei.

O que leva milhares de pessoas a brindar com assobios alguém que lidera com 5 pontos de vantagem um campeonato, e que ganha boa parte dos jogos de goleada? A resposta devia ser “Nada, isso não pode acontecer”, mas de facto é para mim tão simples como: o histórico de derrotas recentes com o Barcelona. A não ser que o português inverta a tendência de resultados negativos contra a equipa catalã, parece que esses “adeptos” continuarão a arranjar motivos para embirrar, até que sejam silenciados com conquistas no final da época (cenário que parece bem provável, porque mesmo sendo um admirador do futebol do Barcelona, Mourinho está a provar mais uma vez o extraordinário treinador que é, e não deverá deixar fugir mais um título para o seu extenso currículo).

E a Comunicação Social não se faz rogada em acompanhar a par e passo e instigar mais desenvolvimentos num episódio tão evitável quanto ridículo, criando um ambiente muito pouco suportável sobre uma equipa que, no global, não o merece. E ponho na palavra aspas porque, muito sinceramente, qualquer adepto que se preze de um clube não pode nunca colocar vitórias e derrotas frente a um rival histórico á frente dos resultados da sua equipa no global.    

Situações destas não são exclusivas de clube A, B ou C. São sim o resultado de toda uma conjuntura criada pelos factos que referi acima, e que minam aquilo que o futebol deve ser: um desporto entusiasmante e com uma disputa saudável, e não um cenário de guerra alimentada por um tipo de mentalidade que já devia ter acabado na Pré-História. Em Inglaterra fez-se um brilhante trabalho de limpeza, e agora é o que podemos ver nos estádios. Para quando seguir esse bom exemplo?

O meu goleiro é um homem de elástico
Os dois zagueiros tem a chave do cadeado
Os laterais fecham a defesa
Mas que beleza é uma partida de futebol
Bola na trave não altera o placar
Bola na área sem ninguém pra cabecear
Bola na rede pra fazer o gol
Quem não sonhou em ser um jogador de futebol?
O meio-campo é lugar dos craques
Que vão levando o time todo pro ataque
O centroavante, o mais importante,
Que emocionante é uma partida de futebol

Skank - Partida de Futebol