Para além das prendas, dos doces e do convívio á mesa com a
família, tenho a minha própria “tradição pessoal” de na véspera de Natal sair á
rua de manhã e dar uma volta pela minha cidade, Viana do Castelo. Gosto muito de
percorrer as ruas e sentir o espírito de Natal a cada esquina que viro. Consegue-se
perceber que não há a correria típica do dia-a-dia (apenas aquela para comprar uma
prenda de última hora), que o semblante das pessoas, apesar das dificuldades
que possam passar, é muito menos carregado, e há mais sorrisos e mais paragens
para conversar ou cumprimentar alguém que se conheça. Diz-se que no Natal há
magia no ar e eu concordo: Não por causa de algo que Houdini tenha lançado algo
de lá de cima, mas porque as próprias pessoas se transformam interiormente, e
pelo menos por um dia tentam esquecer as agruras da vida e o sentimento de alegria e esperança
impera.
Isto costuma ser assim todos os anos, mas neste em
particular, por tudo aquilo que se anuncia para 2012, tinha uma certa
curiosidade em perceber o que ia encontrar. Teria este Governo, ajudado também
pelas asneiras de outros que governaram (?) Portugal nos últimos anos, finalmente
conseguido lançar os portugueses numa depressão da qual nem o Natal escaparia? Iria eu ver as ruas vazias, e dar o meu tempo por mal empregue?Cheguei a casa para almoçar contente pelo que vi e ouvi, confirmando que a minha dúvida era infundada: Apesar de muitos expressarem preocupação com o que aí vem (eu também o faço), uma data como esta continua a ocupar um lugar de destaque na maioria das pessoas. E não é o não se poder comprar aquela prenda caríssima para a qual o subsídio por inteiro ajudava, o ter que se comprar menos prendas e mais “lembrancinhas” porque o dinheiro não estica, ou mesmo o haver poupanças na decoração nas ruas que faz deste um Natal muito mais triste que os outros. Os mesmos sorrisos e a mesma pontinha de esperança continuaram presentes por mais um ano. Nem tudo é mau então…
Creio que será interessante partilhar convosco este excerto de uma conversa que ouvi numa loja onde entrei em busca de uma prenda que me faltava, e que reforça um pouco isto que falei:
CLIENTE: Pois é, então compro-lhe aqui
esta mala para a minha mulher. Há que aproveitar para mimarmos enquanto ainda
temos dinheiro.
LOJISTA: Pois é, vamos ver o que para
aí vem.
CLIENTE: Isto está muito mal, e ainda
vai ficar pior. E esses *** desses políticos não querem saber da gente. Já nem
consigo ouvir aquele *** do Passos Coelho. Só promessas, e agora só nos
enterra. E são todos assim!
LOJISTA: É verdade, mas olhe, sabe o
que lhe digo? Vamos viver um dia de cada vez… Não vale a pena andarmos aqui
angustiados, que assim nem vivemos direito. Vamos lidando com as coisas
conforme elas apareçam.
CLIENTE: Mas uma pessoa vê as notícias
e até fica maldisposta…
LOJISTA: Eu já nem vejo as notícias,
que senão uma pessoa fica completamente em baixo. Isto está mau e aqui na loja
também, mas se me for abaixo que será de mim, não é? Tenho o meu filho para
criar, e com mais ou menos dificuldades a gente vai-se orientando… E é Natal,
hoje pelo menos não há que pensar nisso! Temos mas é que festejar este dia.
CLIENTE: É um bocado difícil, mas você
tem razão! Também tenho filhos, e no fundo temos que ir em frente, nem que seja
por eles. Vamos lá a ver no que isto dá. Bom Natal para todos!
Saí de lá sem encontrar o que procurava, mas satisfeito com
o que ouvi. A esperança de pessoas como esta e outras que passam momentos
complicados merece sempre o nosso reconhecimento.
Á tarde, a cidade continuava em grande animação, com
famílias e grupos de amigos reunidos no centro em salutar convívio. Entre um
petisco e um copinho, as conversas, risos e felicitações sucediam-se. Um
lamento aqui e ali, mas “não pensemos nisso agora, que hoje é Natal”. E lá
cheguei eu a casa para me sentar á mesa convencido que, por mais dificuldades
que tivermos que passar ou as chatices que tenhamos que suportar, há coisas bem
mais importantes, por muito que meia dúzia de acéfalos maníacos da
competitividade e do crescimento económico não gostem disso! E uma delas são as
pessoas que nos rodeiam, e as datas especiais como esta.
“A vida é feita de pequenos nadas”, já dizia o Sérgio
Godinho. Mas é sobretudo nestas alturas difíceis que esses pequenos nadas têm
que ganhar ainda mais importância e tornar-se o quase tudo, para ajudar a
contrabalançar o nosso estado de espírito para níveis positivos, por muito que
um grupo de tecnocratas engravatados tentem deitar-nos abaixo com cortes e
aumentos.
Por isso, lanço desde já um requerimento a Passos Coelho,
Cavaco, e a qualquer outro Primeiro-Ministro e Presidente da República que
venha no futuro: Façam a vossa parte e abstenham-se de aparecer na TV com
mensagens de Natal e Ano Novo fabricadas e hipócritas que não fazem falta
nenhuma. Não precisamos que vocês digam aquilo que não sentem, nós temos o
espírito dentro de nós, e isso vocês não podem roubar nem taxar.
“I don't care about anything else
Christmas is almost here
And I don't care what the news man said
Christmas is full of cheer
I don't care about anything
Except hearing those sleigh bells a'ring-a-ding, ding
I wish it was Christmas today”
Christmas is almost here
And I don't care what the news man said
Christmas is full of cheer
I don't care about anything
Except hearing those sleigh bells a'ring-a-ding, ding
I wish it was Christmas today”
Julian Casablanca - I wish it
was Christmas today